O presidente Lula há quase duas décadas recebe uma pensão de vítima da ditadura militar. Motivo: ter ficado algumas semanas preso no Deops, jogando bola com outros sindicalistas, conforme se via nas fotos publicadas em jornais e revistas da época; e haver sido desalojado arbitrariamente da presidência do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, que, ao que se saiba, é um mandato temporário e não um emprego fixo.
Hoje sua pensão supera os R$ 4 mil mensais. E o total que ele já recebeu ultrapassa R$ 700 mil.
Apesar disso, ele não tem pejo de passar por cima dos direitos das verdadeiras vítimas da ditadura – aquelas cuja carreira não foi alavancada, mas sim comprometida pelas perseguições, torturas e detenções sofridas.
Ao assumir a Presidência da República, prometeu solenemente aos ex-presos políticos que aumentaria de forma substancial os recursos para pagamento das reparações decididas pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça.
No último mês de julho, entretanto, editou Medida Provisória escalonando de 2007 a 2016 o pagamento das indenizações retroativas que a Comissão concede. Isto depois que várias dessas indenizações já foram pagas, aos priorizados na marcação de julgamentos.
Durante a minha luta em 2004 e 2005, demonstrei cabalmente que os critérios da própria Comissão para agendar julgamentos não estavam sendo seguidos, permitindo que os favoritos da corte palaciana fossem passados à frente dos demais. O Ministério Público Federal, por mim acionado, constatou várias irregularidades.
Agora, estabelece-se uma diferenciação odiosa: quem teve sorte (ou bons padrinhos) e foi pago antes, recebeu tratamento vip; os demais, relegados à vala comum, precisarão sobreviver por mais dez anos se quiserem receber tudo que o Estado brasileiro lhes deve.
Os direitos atingidos, cobertos por essa reparação, remontam principalmente à fase 1964/1975. Os anistiados, em sua maioria, são septuagenários ou octogenários. Quantos estarão vivos em 2016?
Vale ressaltar, também, que as tais "indenizações milionárias" trombeteadas na mídia e utilizadas "ad nauseam" como argumento pelos adversários do programa não passam de algumas dezenas -- e são exatamente as que foram passadas na frente. Estamos falando agora de pessoas que tiveram suas vidas praticamente destruídas por um regime de exceção e precisam das reparações para ter alguma paz de espírito nos anos que lhes restam.
Cabe ao Congresso Nacional rejeitar esta MP iniqüa e inconstitucional. E aos cidadãos decentes, exigir que, neste e em tantos outros casos, comece a ser feita justiça em nosso país.
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14.1.07
MP ATINGE DIREITOS DOS ANISTIADOS (ago/2006)
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