Celso Lungaretti (*)
A tropa de choque da Polícia Militar paulista certamente vai aparecer com destaque no noticiário do próximo dia 2 de outubro, quando o massacre do Carandiru completará 15 anos. A invasão intempestiva e desnecessária de um presídio deixou um saldo de 111 presos assassinados, num dos episódios mais escabrosos da História recente brasileira.
Comprovando que esqueceu completamente as leituras e os ideais da mocidade, o governador José Serra parece ansioso por fazer com que São Paulo receba outra vez a mesma lição. Acabará conseguindo.
Na madrugada de quarta-feira (22), a PM invadiu desnecessariamente a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo para desalojar à força 400 manifestantes que lá estavam desde a tarde do dia anterior e sairiam naquele mesmo dia -- ou, o mais tardar, na 6ª feira, quando acontecerá o principal ato em SP da Semana de Jornada de Lutas, movimento nacional pela melhora do ensino promovido por 40 entidades, inclusive a União Nacional dos Estudantes.
Ou seja, para a retirada de jovens que ficariam lá pouquíssimo tempo e não impediam o prosseguimento das aulas, o ex-presidente da UNE colocou seres humanos em risco e igualou-se aos inimigos de outrora, como o famigerado secretário de Segurança Pública responsável pela invasão da PUC, exatamente em 22 de setembro de 1977.
Então, nas duas efemérides negativas que se aproximam, Serra deverá ser comparado, respectivamente, ao ex-secretário Erasmo Dias e ao ex-governador Luiz Antônio Fleury Filho. E, convenhamos, fez por merecer.
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A novela sem fim em que se transformou o caso de Renan Calheiros desmoraliza a democracia brasileira. Como qualquer cidadão, ele tem todo direito de se defender das gravíssimas acusações que lhe são feitas. Como presidente do Senado, ele jamais deveria permanecer nessa posição enquanto se procede, com lentidão exasperante, a apuração desses episódios.
Se Renan se respeitasse e quisesse fazer-se respeitar, tomaria a iniciativa de licenciar-se não só da presidência do Senado, como do próprio mandato, até que não pairassem dúvidas sobre sua honestidade.
Se o Senado se respeitasse e quisesse fazer-se respeitar, manteria Renan fora da presidência enquanto pairassem dúvidas sobre sua honestidade e o reconduziria a essa posição na remotíssima eventualidade de ele ser inocentado.
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Chamado de “pistoleiro” por Zé Dirceu, Diogo Mainardi reagiu, na Veja de 22/08/2007, utilizando sua coluna inteira para apresentar e discutir os dados de uma agenda telefônica do desafeto. Publicou nomes, datas, algarismos de telefones e anotações, para daí extrair conclusões policialescas.
Disse apenas ter recebido a agenda, sem esclarecer como e de quem. Zé Dirceu, no seu blog, garante que se trata de “acesso ilegal que [Mainardi] teve a dados que foram enviados à CPI”.
Tenha ele bisbilhotado o conteúdo de uma agenda perdida por (ou roubada de) Zé Dirceu, ou sido municiado por algum parlamentar que jamais poderia lhe repassar dados sigilosos de uma CPI, o certo é que Mainardi atropelou a ética jornalística, comportando-se como um reles araponga. Deveria mudar de profissão.
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A imprensa exumou o caso do mensalão, por conta da apreciação, por parte do Supremo Tribunal Federal, da denúncia que o procurador-geral da República apresentou contra a “organização criminosa" que atuava para "desviar dinheiro público e comprar apoio político".
Moralmente, a aceitação da denúncia e conseqüente abertura de ação penal contra os 40 mensaleiros significará muito.
Em termos práticos, quase nada. Eles vão ter de pagar advogados caros e comparecer a algumas audiências tediosas, mas é quase certo que seus casos se arrastarão inconclusos por tanto tempo quanto os de Paulo Maluf.
Ou se criam mecanismos para evitar que os ricos e poderosos abusem de recursos protelatórios para escapar das grades, ou continuaremos sendo o país terrivelmente injusto e até anedótico no qual só os pobres vão para a prisão.
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No dia seguinte à tragédia de Congonhas, eu já escrevia que a responsabilidade maior era das empresas aéreas e sua ganância criminosa: “Dinheiro é mais importante do que seres humanos, na lógica capitalista levada às últimas conseqüências”.
Houve, como sempre, os que me acusaram de parcial e tendencioso. E as minúcias e irrelevâncias foram discutidas ad nauseam pela imprensa, bombardeando os cidadãos comuns com um tal volume de informações que a maioria acabou não conseguindo separar o joio do trigo. A mídia atordoante cumpriu seu papel de promover espetacularização e propiciar catarse, mas não esclarecimento.
A saturação sobreveio e a atenção da maioria silenciosa se voltou para outras atrações, de forma que só a minoria esclarecida está acompanhando a elucidação do crime: um aeroporto inseguro foi colocado em operação por força do poder de persuasão que as empresas aéreas exerceram sobre a Infraero e a Anac, a ponto da diretora da agência reguladora haver mentido à Justiça para agilizar a liberação da pista.
Mandantes, lobbistas e funcionários do Estado que se deixaram subornar deveriam todos ser acusados de homicídio culposo e punidos exemplarmente, para as 199 mortes não terem sido em vão.
* Celso Lungaretti é jornalista e escritor. Mais artigos em http://celsolungaretti-orebate.blogspot.com/
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24.8.07
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