(resumo da exposição de Celso Lungaretti na mesa-redonda "Metamorfoses sócio-econômicas, segregação sócio-espacial e o fenômeno da violência na Grande Vitória", durante o "II seminário Internacional de Desenvolvimento Local", realizado no mês de dezembro de 2007 em Vitória, ES)
O problema da escalada da criminalidade no Brasil vai muito além da ótica simplista e repressiva da nossa mídia. Tem a ver com o estilhaçamento da família e da sociedade sob o capitalismo globalizado.
No chamado capitalismo industrial, ambas ainda se mantinham razoavelmente estruturadas, apesar de todos os defeitos que tão bem conhecemos: desigualdades econômicas e sociais, elitismo, autoritarismo, etc.
No final da década de 1960, entretanto, esse modelo chegou ao esgotamento. O próprio capitalismo demandava uma desestruturação da antiga sociedade, para erguer uma nova sobre seus escombros. Os jovens, entretanto, tentaram ir mais longe: em vez da substituição de uma forma de dominação por outra, sonharam com o fim de todas as dominações.
Com o fracasso das tentativas revolucionárias do período, implantou-se, em meio à paz dos cemitérios, a sociedade de massas, em que tudo e todos devem estar permanentemente disponíveis para o consumo.
A comunicação de massas deixou de lado a missão de formar (expoentes da elite) para o exercício do pensamento crítico, restringindo-se a apenas informar fragmentariamente e a repisar os valores capitalistas.
O trabalho perdeu qualquer atrativo que ainda tivesse como concretização do potencial criativo do ser humano. Tornou-se uma corrida de ratos atrás do dinheiro, sem ética nem o mínimo respeito pelo interesse público.
O ingresso em massa da mulher no mercado de trabalho aviltou remunerações e colocou toda a família a serviço do "sistema", transformando o lar em mero dormitório.
A família foi estilhaçada pela influência atordoante da comunicação de massas. Pais e mães cansados não conseguem competir em sapiência com a telinha que hipnotiza as crianças, impingindo os valores consumistas.
Então, nada existe de estranho no fato de que as pessoas sem aptidões para competir dentro do sistema busquem atalhos para conseguir aqueles bens dia e noite propagandeados como objetos de desejo.
Perplexos, muitos cidadãos gostariam de ver aplicadas aqui as punições drásticas dos países muçulmanos: que se cortassem as mãos dos ladrões, o pênis dos estupradores e a vida dos assassinos. Olho por olho, dente por dente.
Outros pedem mais policiais nas ruas, de preferência atirando primeiro e perguntando depois... nos bairros pobres ou quando os suspeitos são negros, pardos ou malvestidos, é claro.
E há os que defendem a maioridade penal a partir dos 14 ou 16 anos, o que somente fará os bandidos diminuírem proporcionalmente a idade do recrutamento de seus serviçais, até que tenhamos crianças empunhando fuzis e metralhadoras. O velho chavão moralista mudará de “hoje mocinho, amanhã bandido” para “hoje bandido, amanhã defunto”.
No fundo, tudo isso são paliativos. Inexiste forma ideal de se lidar com aqueles que já se tornaram bestas-feras, nocivos para si próprios e para a sociedade. Pode-se, quanto muito, controlá-los – e a um custo dos mais elevados para um país de tantas e tão dramáticas carências.
Exterminá-los, jamais! Isso levaria a violência a patamares apocalípticos, pois os bandidos não teriam mais nada a perder. Nós, sim, perderíamos, ao abrirmos mão da civilização arduamente construída nos milênios que nos separam da horda primitiva, voltando à estaca zero.
O xis do problema, no entanto, nunca é discutido: o fato de que a criminalidade é intrínseca ao capitalismo e subsistirá enquanto não substituirmos o primado da ganância e da competição pelo da solidariedade e da cooperação.
Vivemos numa sociedade que desperdiça o potencial já existente para se proporcionar uma existência digna a cada habitante do planeta; que faz as pessoas trabalharem muito mais do que o suficiente para a produção do necessário e útil; que condena parcela substancial da população economicamente ativa ao desemprego, à informalidade e à mendicância; que estimula ao máximo a compulsão consumista sem dar à maioria a condição de adquirir seus objetos de desejo; que retirou do trabalho qualquer atrativo como realização individual, tornando-o apenas um meio para obtenção do vil metal (ou seja, uma nova forma de escravidão).
Então, os que ainda têm emprego e os empreendedores continuarão irrealizados, esforçando-se demais para nunca obterem as gratificações almejadas, pois a lógica do capitalismo é perpetuar a insatisfação e mitigá-la com o consumo (a cenoura colocada à frente do asno para que ele continue puxando a carroça). Um círculo vicioso perverso que faz a fortuna dos analistas, dos farsantes religiosos e dos picaretas da auto-ajuda.
Alguns excluídos continuarão vivendo das esmolas dos programas oficiais e vão ajudar a eleger aqueles a quem convém mantê-los em eterna dependência.
Outros tentarão obter pela força aquilo que jamais alcançarão pela competência. E servirão de espantalho para intimidar as classes superiores, fazendo-as crer que uma sociedade policial seria a solução.
É paradoxal que, em nossa época, formidáveis avanços científicos e tecnológicos coexistam com uma regressão ao ambiente medieval, com os nobres entrincheirados em condomínios de alto padrão, circulando em veículos brindados e só podendo levar vida social em shopping centers, não ousando mais exporem-se fora de suas fortalezas. No exterior desses espaços fortificados e vigiados, os bárbaros estão sempre à espreita, prontos para desferir seus golpes.
Uma previsão terrível de Friedrich Engels, um dos pais do marxismo: quando uma sociedade consegue aniquilar as forças progressistas que poderiam levá-la a um estágio superior de civilização, acaba sendo destruída pela barbárie. O paralelo é com Roma, que venceu os gladiadores de Spartacus mas sucumbiu aos povos atrasados, condenando o mundo a séculos de trevas.
Resta saber se, no século 21, a ameaça maior à civilização se corporifica nos criminosos cada vez mais abusados e no surto de populismo autoritário no 3º mundo, nos fanáticos religiosos que derrubam torres gêmeas ou na fúria com que a natureza começa a reagir às agressões sofridas.
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1.2.08
A CRIMINALIDADE É INTRÍNSECA AO CAPITALISMO
Marcadores:
capitalismo,
Friedrich Engels,
violência
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2 comentários:
é apocalíptico ! se a solução é fugir para as cidades de interior, pesquisas apontam o aumento vertiginoso da criminalidade e violência nas províncias.
mesmo assim, no interior, onde o ser humano parece ter mais valor, parece ser esse o melhor caminho- fugir!
Quanta bobagem… estilo panfletario pobrissimo. Nada sabe sobre Historia, Roma e pouco ente de marxismo ou capitalismo.
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