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21.2.10

"FOLHA". NÃO DÁ PRA NÃO VOMITAR

Assim um jornal do Grupo Folha coonestou a farsa com que a repressão encobriu a execução do "Bacuri", após terrível calvário.

Durante as trevas ditatoriais no Brasil, um oficial de alto escalão certa vez se queixou de que um jornal carioca estaria movendo guerra psicológica adversa contra o regime.

Motivo? É que o matutino montara uma página só com tragédias e catástrofes ocorridas no mundo inteiro, tendo no centro a notícia e foto de uma entrega de espadins aos calouros de uma academia militar.

O gorila avaliou que a imagem de fardados sorridentes, cercada de sofrimento por todos os lados, seria uma maneira subliminar de colocar os leitores contra os milicos, burlando a censura.

Nas minhas (posteriores) décadas de atuação jornalística, perceberia que, si non è vero, è bene trovato: o mero maquiavelismo é muito mais frequente na imprensa do que a mera coincidência.

Um exemplo conspícuo é a capa da Folha de S. Paulo deste domingo (21), tendo como manchete "Dilma faz defesa do estado forte e prega estabilidade" e destacando, na chamada de uma retranca secundária, que "Ministra diz ter feito no exterior treinos militares".

Gato escaldado, o jornal evita sugerir outra vez que um eventual governo de Dilma Rousseff criaria uma infinidade de novas estatais. Sua credibilidade cairá ainda mais se continuar recebendo cala-bocas irrefutáveis.

Mas, não desistiu de insinuar que Dilma é uma estatizante compulsiva, ao colocar em primeiríssimo lugar um tema que, na própria notícia a que a manchete remete, só aparece na metade final:
"Dilma, porém, reafirmou a proposta de fortalecimento do Estado, citada por Lula em sua fala, quando disse à ministra: 'Isso é bom Dilma, não é ruim', ao lembrar que a oposição a acusa de ser estatizante. 'Continuaremos a valorizar o servidor e o serviço público, reconstituindo o Estado, recompondo sua capacidade de planejar, gerir e induzir o desenvolvimento do país', afirmou ela.

"Ao defender o Estado, Dilma disse que o desastre da crise econômica mundial não foi maior no Brasil porque os 'brasileiros resistiram a esse desmonte e conseguiram impedir a privatização da Petrobras, do Banco do Brasil, da Caixa Econômica ou de Furnas', momento em que foi aplaudida".
Percebe-se, claro, que Dilma escolhe cuidadosamente as palavras, para não indispor-se nem com os estatizantes encontrados em suas fileiras, nem com os devotos do deus-mercado existentes fora delas. Políticos são assim mesmo, navegam nas águas da ambiguidade.

Mas, a insistência da Folha em afixar-lhe tal etiqueta já beira o ridículo. Onde cabem pelo menos duas interpretações, trombeteia sempre aquela que maior prejuízo causará à campanha presidencial de Dilma.

Idem, a obsessão em apresentá-la como uma sanguinária ex-guerrilheira, o que verdadeiramente não foi.

Militou na resistência à ditadura de 1964/85, mas como organizadora e dirigente, não como integrante das unidades de ação armada. Por mais que tente, a direita ainda não conseguiu prova nenhuma de que Dilma haja participado pessoalmente de sequestros, expropriações, etc.

Ademais, em nações submetidas a governos despóticos, todo cidadão tem o direito de resistir à tirania, pelos meios possíveis. A partir do AI-5, o único meio possível no Brasil ficou sendo a luta armada.

Assim como nos países europeus submetidos ao jugo nazista. O que poderia fazer a Resistência Francesa, além do que fez? Entregar flores aos carrascos de Hitler?

Canso de afirmar que a ninguém ocorre, na França, apresentar os heróis e mártires da Resistência como autores de crimes comuns, embora suas ações tenham sido indiscutivelmente mais violentas do que as praticadas pelo Colina, VPR e VAR-Palmares (as organizações nas quais Dilma militou).

O jornal, entretanto, faz questão de sintonizar-se com a pregação totalitária das viúvas da ditadura.

Como se fosse um Ternuma qualquer, falseia a História para, panfletariamente, associar a Dilma uma imagem de violência. Chegou ao cúmulo de tentar envolvê-la, forçando a barra ao extremo, com um plano de sequestro que nunca saiu do papel nem era atribuição dela.

E, da mesma forma que os sites fascistas, a Folha apresenta esses episódios sem contextualização. P. ex., para quem conhece o festival de horrores desencadeado pela assinatura do AI-5, que deu sinal verde para a repressão política barbarizar e assassinar à vontade, não causa surpresa nenhuma que os movimentos de resistência pretendessem sequestrar o ministro Delfim Netto.

Como signatário do nefando ato, Delfim escolheu ser alvo das ações dos resistentes. Que, no caso, estavam longe de ser drásticas. Pretendia-se apenas trocá-lo por presos políticos que sofriam torturas terríveis nos porões da ditadura, podendo ser executados a qualquer momento.

Dilma, dignamente, jamais negou sua responsabilidade política pelo que fizeram ou planejaram as organizações em que militava.

Mas, isto é pouco para a propaganda enganosa da extrema-direita. Esta quer porque quer plantar a imagem de que Dilma apertava gatilhos e acendia pavios. Daí inundar a internet com fichas policiais falsas, como a que a Folha entusiasticamente reproduziu, num dos maiores vexames jornalísticos de seus 89 anos de história.

Agora, do enorme perfil que o jornal apresenta de Dilma, repleto de trechos mais interessantes, o que destaca na primeira página é o fato de ela ter feito um treinamento militar básico no Uruguai.

Novamente, cabe a pergunta: o que deveríamos fazer, nós que enfrentávamos os efetivos altamente treinados da repressão política e seu poder de fogo infinitamente superior? Nem aprendermos a nos defender com um mínimo de competência nós podíamos? É como sacos de pancada que o Grupo Folha nos queria?

Na verdade, sim. Tanto que, no momento dos acontecimentos, disponibilizava veículos para o DOI-Codi, enquanto lhe dava sustentação política em seus jornais.

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