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8.1.15

PARTO NORMAL DEVE SER ESTIMULADO, JAMAIS IMPOSTO!

Já dizia o Joelmir Betting: "Na prática, a teoria é outra"...
No momento em que o Ministério da Saúde lança um novo pacote de medidas para reduzir o número de partos cesarianos no Brasil, vale a pena recordarmos um episódio ocorrido em meados de 2008.

Cristina dos Santos Cavalcante residia num bairro pobre da zona Leste paulistana, a uns 15 quilômetros do Centro. Tinha 29 anos e esperava sua segunda criança.

Fez o pré-natal na Unidade Básica de Saúde do Jardim Independência, da rede municipal. O nascimento do filho estava previsto para o dia 15 de junho.

A data chegou, passou... e nada. Então, recorreu ao Hospital Estadual de Vila Alpina. Mas, em cada consulta, diziam-lhe que estava tudo normal e deveria voltar dentro de dois dias.

Apesar de suas precárias condições financeiras, ela pagou por um ultra-som numa clínica particular. O exame revelou que o cordão umbilical tinha dado duas voltas no pescoço da criança.

Levou o laudo na consulta seguinte, às 9 horas do dia 27 de junho, sendo internada imediatamente.

Em vez de efetuarem logo uma cesárea, deram-lhe medicamentos para induzir o parto normal, que acabou ocorrendo somente às 23h20 (!).
Viúvo comprova a passagem por dois hospitais

Cristina teve então hemorragia e não havia médico capacitado para dar-lhe o atendimento correto. Os jovens residentes tiveram de chamar “um especialista”.

Quando este finalmente chegou, não havia vaga para Cristina na UTI.

Quarenta minutos depois (!!), levaram-na a uma sala de observação (!!!), na qual não havia equipamento nenhum. E foi lá que ela morreu, seis horas depois do parto.

Parte desse tempo foi desperdiçada com a repetição de exames de sangue que a paciente já fizera no mesmo hospital – como se, no momento da emergência, não houvesse a certeza de que o tipo sanguíneo dela fosse aquele que constava da sua ficha.

Segundo o viúvo Márcio Ferreira da Costa, a primogênita já nascera por meio de cesariana, "o que mostra que já não era muito aconselhável fazer o parto normal desta vez”. E acrescentou:
"Ela não tinha nada de dilatação. Minha mulher tinha a cintura muito fina e o neném nasceu com quase 4 quilos. Chegando na parte do ombro, o bebê travou e ficou cerca de 5 minutos sem respirar. Ao nascer, nem chorou, foi direto para os aparelhos".
O hospital registrou a morte como “natural” no 56° Distrito Policial - Vila Alpina.

Tomei conhecimento disso tudo pelo jornal Folha de Vila Prudente e, claro, fiquei indignado. Querendo mais detalhes, liguei para o repórter responsável pela série, Rafael Gonçalo, e fiquei sabendo que a proporção de partos normais no Hospital da Vila Alpina ultrapassava 75%. 

Era, em suma, o hospital escolhido pela Secretaria de Saúde como cartão postal das excelências do tal parto humanizado. Daí o empenho de uma rede de apoiadoras desta prática em abafar o caso; abarrotaram-me a caixa postal de críticas ao meu interesse pelo episódio, como se a morte de uma mãe por clamorosa negligência não devesse ser noticiada.
Cristina morreu. Sua filha ficou órfã. Alguém foi punido?

As fanáticas eram movidas por seu fanatismo, mas logo percebi que o empenho da Secretaria da Saúde não se devia apenas à obsessão em impor às coitadezas a solução tida como melhor para elas. Afinal, o parto normal sai muito mais barato para os cofres estaduais e a vida me ensinou que quem pensa o pior dos governos, quase sempre acerta.

Minha conclusão de então continua válida até hoje:
"...autoridades e fanáticas têm todo direito de tentarem persuadir as gestantes pobres de que o parto normal é melhor para elas, mas nenhum direito de forçá-las a abdicar da cesárea, se é o que elas preferem".
Espero que as novas medidas (e a forma como forem implementadas) respeitem o direito das pacientes de, certas ou erradas, darem a última palavra. 

Porque gado a gente marca, tange, ferra, engorda e mata, mas com gente é diferente!

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