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1.8.14

REPÚBLICA KAFKIANA DO BRASIL

Sou idoso e impetrei um mandado de segurança que neste sábado (2) completará 90 meses de tramitação no Superior Tribunal de Justiça.

Não errei nas contas. São SETE ANOS E MEIO (!!!) transcorridos desde o pontapé inicial, em 08/02/2007, quando o STJ o recebeu e lhe atribuiu o nº único 0022638-94.2007.3.00.0000.

Em 08/08/2012 a Corte registrou a entrada do meu pedido de prioridade nos trâmites, em conformidade com o Estatuto do Idoso, cujo art. 71 estabelece:
"É assegurada prioridade na tramitação dos processos e procedimentos e na execução dos atos e diligências judiciais em que figure como parte ou interveniente pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, EM QUALQUER INSTÂNCIA" (grifo meu).
O processo se encontra totalmente parado desde 21/09/2012, quando, após as duas partes se manifestarem sobre a decisão tomada pelo relator em 23/08/2012, foi recebido de volta no gabinete do dito cujo. Então, como ainda não encontrei o segredo da vida eterna e espero ver o caso concluído durante minha estada na Terra, requeri à Ouvidoria do STJ que fizesse respeitar o Estatuto do Idoso. Eis a resposta:
"... informamos que a sua manifestação será levada ao conhecimento do gabinete.
Lembramos, contudo, que, de acordo com o Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, é atribuição exclusiva do Ministro relator ordenar e dirigir o processo a ele distribuído (RISTJ, art. 34, I)".
Fiquei confuso: é possível que um mero regimento interno prevaleça sobre uma Lei decretada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente da República (a Lei nº 10.741, de 01/10/2003)? Ainda mais quando, no texto da referida Lei está inequivocamente determinado que ela deve obedecida EM QUALQUER INSTÂNCIA?

Como não sou jurista, apenas um cidadão com bom senso e espírito de justiça, peço aos doutos que me esclareçam. E, se estiver certo eu e errada a Ouvidoria, que me defendam, pois esta é apenas mais uma da longa série de interpretações duvidosas e sempre desfavoráveis a mim, no tortuoso desenrolar do meu processo.

CADÊ O RITO SUMÁRIO QUE ESTAVA AQUI? O GATO COMEU.

Eu mesmo e também vários companheiros já nos queixamos, à presidenta da República e ao ministro da Justiça, das anomalias que desde o início vêm perpassando a tramitação do meu mandado de segurança --começando pela morosidade aberrante em se tratando daquele que deveria ser "um remédio constitucional, de natureza mandamental, RITO SUMÁRIO e especial".

A resposta tem sido sempre a mesma: a de que a responsabilidade caberia ao STJ, estando o Executivo de mãos atadas.

Mas, não foi o Poder Judiciário que decidiu retardar o cumprimento da decisão que ele próprio tomou no julgamento do mérito da questão realizado em 23/02/2011, quando todos os oito ministros reconheceram o meu direito.

Embora seus efeitos tenham sido sustados por uma bizarra decisão monocrática do relator recém-empossado, anulando com uma penada a sentença unânime de seus colegas e desprezando o entendimento a que o antigo relator chegara após quatro anos de acompanhamento passo a passo do caso, TAL ESQUISITICE FOI PROPICIADA POR (MAIS) UMA CLARÍSSIMA MANOBRA PROTELATÓRIA DA ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO, que faz parte do Poder Executivo.

Ou seja, já lá se vão 41 meses que o cumprimento da sentença do STJ está sendo retardado porque a AGU, obrigada a bater em retirada quanto ao mérito da questão, saiu pela tangente, arguindo uma filigrana jurídica para causar mais delongas, qual seja a de que mandado de segurança não seria o instrumento jurídico adequado. E o novo relator, surpreendentemente, aceitou:
"... analisando-se melhor os autos, percebe-se que o julgado ora embargado, ao contrário do que se registrou, olvidou-se da existência de consolidado entendimento nesta Corte Superior, com arrimo no enunciado 269 da Súmula de Jurisprudência do egrégio Supremo Tribunal Federal, no sentido de que o Mandado de Segurança não pode ser utilizado como mero substitutivo de Ação de Cobrança" (decisão monocrática do ministro Napoleão Nunes Maia Filho, em 15/08/2012).
Afora o descortesia para com oito outros ministros, nota-se também uma grave incorreção: ele diz ter sido olvidada uma questiúncula que, na verdade, havia sido considerada e rechaçada! A AGU já a submetera ao relator anterior, Luis Fux, que a fulminou em 19/10/2007:
"A determinação para que a autoridade coatora, in casu, o Ministro de Estado do Planejamento e Gestão, cumpra a requisição do Ministro da Justiça no sentido de efetuar o pagamento dos retroativos a anistiado político, não atrai a incidência das Sumulas n.ºs 269 e 271, do STF, porquanto, aqui, não se trata de utilizar-se do mandado de segurança como substituto da ação de cobrança, mas, tão-somente, de determinar o cumprimento de ato administrativo legal e legítimo".
ALEGAÇÕES PERIFÉRICAS, EVASIVAS,
 REAPRESENTADAS A TORTO E A DIREITO.

E por que a AGU, na sua inexplicável insistência em postergar indefinidamente o pagamento do que é justo e devido para mim, recorre a alegações periféricas e evasivas, inclusive reapresentando-as depois de já terem sido categoricamente repelidas? Simplesmente porque, quanto ao fulcro da questão, não tem nada, absolutamente nada, para contrapor à sentença de 23/02/2011.

A Lei nº 10.559, de 13/11/2002, estabelecera o seguinte:
Art. 18.  Caberá ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão efetuar, com referência às anistias concedidas a civis, mediante comunicação do Ministério da Justiça, no prazo de sessenta dias a contar dessa comunicação, o pagamento das reparações econômicas, desde que atendida a ressalva do § 4o do art. 12 desta Lei.
§ 4o  As requisições e decisões proferidas pelo Ministro de Estado da Justiça nos processos de anistia política serão obrigatoriamente cumpridas no prazo de sessenta dias, por todos os órgãos da Administração Pública e quaisquer outras entidades a que estejam dirigidas, ressalvada a disponibilidade orçamentária.
A decisão do ministro da Justiça, em 30/09/2005, foi:
"Declarar Celso Lungaretti anistiado político, concedendo-lhe reparação econômica, de caráter indenizatório, em prestação mensal, permanente e continuada (...), com efeitos retroativos da data do julgamento em 27.07.2005 a 29.10.1996, totalizando 104 (cento e quatro) meses e 28 (vinte e oito) dias, perfazendo um total indenizável de..."
No início de 2007, 16 MESES DEPOIS, EU AINDA NÃO HAVIA RECEBIDO A INDENIZAÇÃO RETROATIVA QUE DEVERIA TER SIDO PAGA EM 60 DIAS, daí minha decisão de impetrar mandado de segurança para que fosse cumprida a Lei e a decisão ministerial.

Logo em seguida, a União enviou carta convidando-me a abdicar VOLUNTARIAMENTE do direito ao pagamento imediato dos atrasados, aceitando VOLUNTARIAMENTE seu parcelamento até o final de 2014. Como o meu mandado já tramitava e como este direito não fora esmola nenhuma, mas sim o justo ressarcimento do sangue que me derramaram, dos terríveis tormentos físicos e psicológicos que sofri, da lesão permanente que me causaram e da honra que me atingiram, eu optei por não desistir VOLUNTARIAMENTE do processo já aberto.

É óbvio que, como a legislação não fora alterada, a Justiça necessariamente teria de mandar que a Lei fosse cumprida, como mandou.

E é chocante que a AGU use todo seu poder de fogo, infinitamente superior, contra mim, para evitar que uma decisão judicial seja cumprida. Pois ela tem um compromisso com a Justiça no sentido maior da palavra; não existe apenas para vencer a qualquer preço ou protelar o cumprimento de sentenças desfavoráveis arguindo ninharias, como fazem os advogados de porta de xadrez.

Não sou dado a delírios persecutórios, nem acredito piamente em teorias da conspiração. Mas, todos hão de convir que é muito estranho o raio cair duas vezes no mesmo lugar. Estou sendo novamente vítima das burocracias arrogantes, arbitrárias e insensíveis, como já o fora quando requeri minha anistia na década passada e, embora o critério primeiro da priorização dos processos (desemprego) me beneficiasse, só comecei a receber minha pensão depois de exatos 50 meses, tendo de mover céus e terras para tanto, enquanto os amigos do rei e os famosos, mesmo não preenchendo as condições necessárias para terem seus casos priorizados, eram atendidos em menos de um ano.

Será vergonhoso para a União e contraditório com a política de direitos humanos dos últimos quatro governos se eu morrer sem ter sido ressarcido das violências cometidas por agentes do Estado em meados de 1970 (!!!). Quarenta e quatro anos já se passaram. Quantos mais precisarei esperar?

E, A PERGUNTA QUE NÃO QUER CALAR: ATÉ QUANDO OS QUE NÃO SE VERGAM VOLUNTARIAMENTE ÀS IMPOSIÇÕES DOS PODEROSOS CONHECERÃO A COMPULSORIEDADE DAS INJUSTIÇAS E DOS ABUSOS DE PODER?

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