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6.12.12

A MÍDIA BRASILEIRA NO SEU PIOR MOMENTO

No capítulo que Carlos Lungarza dedicou à mídia impressa em Os cenários ocultos do Caso Battisti --livro da Geração Editorial que será lançado nesta 5ª feira (6), a partir das 19 horas, na Livraria Cultura do Shopping Bourbon, no bairro paulistano da Pompéia--, merecem especial destaque suas críticas contundentes, mas justificadíssimas, aos três piores vilãos midiáticos durante a empreitada que ele apropriadamente qualificou de   inquisição tropical: o jornal Folha de S. Paulo e as revistas veja e Carta Capital.

Vale a pena reproduzir os principais trechos do Lungarzo, com alguns comentários meus no rodapé. Os intertítulos também são meus.

O JORNAL DA DITABRANDA E SEU LOBBISMO INÚTIL

A Folha de S.Paulo, um dos jornais favoritos das elites, foi grande propagandista da ditadura de 1964 e ativa colaboradora logística, emprestando seus caminhões aos comandos militares de tortura, que os usaram para deslocar cadáveres dos mortos em tormentos (1). 'Converteu-se' à democracia na década de 1980, quando a repressão já não produzia lucros (2). 

Atualmente, debocha dos defensores de direitos humanos e oferece suas páginas aos genocidas militares aposentados. O jornal insulta e usa palavras como  terrorista  para quem não é nem foi. Além disso, enfatiza todos os fatos negativos que encontra sobre o caso Battisti, mas omite os fatos positivos apresentados por fontes fidedignas.

Em 19 de janeiro de 2009, o jornal ofereceu seu melhor espaço ao magistrado italiano Armando Spataro, que contou uma versão dos fatos mais iníqua que a dos autos italianos.

A Folha.com (versão eletrônica do jornal) deu apoio 'implícito' aos vingadores, como Alberto Torregiani, o filho do ourives, cujas opiniões receberam ampla difusão (3), muitas das quais a seção latino-americana da Ansa teve o pudor de não publicar. Entre janeiro de 2009 e fevereiro de 2010, a Folha.com divulgou quinze das 'reflexões' do jovem Torregiani.

...O jornal cometeu alguns 'erros' de tradução. Durante uma fala da escritora Fred Vargas, na edição de 2 de fevereiro de 2009, a Folha On line traduziu a expressão 'militants de gauche' (militantes de esquerda), usada pela romancista, com um termo 'um pouco' diferente: terroristas. Já não se fazem tradutores como antigamente!

...A Folha, como outros órgãos fraternos, ficou furiosa quando, em 8 de junho de 2011, Battisti foi solto pelo STF. Mas o esforçado jornal não desprezou as novas chances de tumulto.

Uma delas foi uma reportagem humilhante de Battisti, que um repórter do jornal conseguiu flagrar aproveitando-se de seu parentesco com a pessoa que gentilmente hospedava o escritor (4).

Outra foi uma notícia inventada, segundo a qual o lançamento do último livro de Battisti, Ao pé do muro, que seria apresentado em São Paulo, havia sido cancelado  sine die  pelo próprio escritor.

A Folha impressa usou seus espaços mais caros e até duas matérias editoriais (5) para publicar compactos libelos contra o refúgio de Battisti, a favor de sua extradição e contra qualquer 'bastardo' que sugerisse que o linchado era inocente.

O FEDOR NAUSEABUNDO DA MARGINAL PINHEIROS

O semanário Veja, do grupo Abril, vende cerca de um milhão de exemplares às classes média e alta e veicula matérias com poucos dados e muito comentário. O magazine combate os movimentos sociais e étnicos, os grupos de direitos humanos, os apoiadores do ensino popular e outros similares.

Também estimula o linchamento em geral, ridiculariza as garantias jurídicas e ovaciona os grupos de extermínio da polícia. Alguns de seus colunistas têm traços psiquiatricamente disfuncionais, um fato que é infrequente na mídia escrita brasileira.

O magazine é especialista em 'surpresas', como notícias sobre corrupção e conspirações baseadas em dossiês não verificáveis. Uma amostra da laia de seu pessoal foi a tentativa de um jornalista de invadir o quarto de um ex-ministro num hotel. Chama a atenção sua extrema agressividade contra seus inimigos, usando termos injuriosos ou ridicularizando formas de comportamento, atividades profissionais, vida privada e até deficiências pessoais.

Um blogueiro da versão eletrônica da Veja, Augusto Nunes, edita a seção Sanatório Geral, onde 'interna' seus desafetos (6), como se as doenças mentais, caso existissem, fossem motivo de chacota. Em novembro de 2009, publicou sarcasmos contra a defesa de Battisti pelo senador Eduardo Suplicy, estimulando leitores anônimos que escreveram comentários irreproduzíveis. Um deles propôs atacar o parlamentar fisicamente quando andava pela rua.

PECADO CAPITAL DA CARTA: PERSEGUIR A ESQUERDA AUTÊNTICA

Carta Capital é um semanário com cerca de 90 mil exemplares que, desde 1994 até o começo do caso Battisti, foi elogiado por leitores jovens que “não eram de esquerda e não sabiam”.

Seu fundador foi o italiano Demétrio Carta, dito  Mino.

A Carta defende um estado nacionalista modernizante, gerido por uma espécie de aliança de classes com hegemonia empresarial, e antagoniza o imperialismo americano e os capitalistas ligados a ele. Parece ideologicamente afim com o ex-comunismo italiano (7) e apoia o PT no Brasil. Quem conhece o jornalismo latino-americano vai achar sua posição muito semelhante à do conhecido comunicador argentino Jacobo Timerman (1923-1999).

A Carta foi o segundo veículo mais empenhado numa intensa campanha contra Battisti. A revista despejou ataques sem pausa em todos os seus números durante vários meses. Eles iam contra os políticos que apoiavam o italiano, os advogados da defesa, os movimentos de solidariedade, os juristas progressistas, as organizações humanitárias e os escritores franceses, especialmente Fred Vargas. Além de rixas pessoais e desafetos ideológicos, os textos mostravam velhos rancores da Itália dos anos 1970, e até de conflitos europeus, como o tradicional desconforto dos italianos com os franceses.

Essa campanha foi marcada por exageros e críticas fora de contexto, mas também por alguns dados inventados. Várias matérias atribuíram a grupos afins aos PAC delitos de homicídio (p. ex., o do delator Guido Rossa), cujos autores, segundo os próprios italianos, eram das Brigadas Vermelhas. Alguns artigos escrutaram a vida pregressa e privada de Battisti em fatos alheios à política. O ímpeto foi tão forte que chegaram a criticar a obra literária de Fred Vargas.

O colunista mais qualificado, Walter F. Maierovitch, disse que, sendo Fred Vargas uma romancista, o que se poderia esperar dela eram dados romanceados, desprezando o fato de que ela é premiada pesquisadora em história e arqueologia.

Maierovitch é o mais inteligente desse grupo, como demonstrou, em 14 de outubro de 2011, ao declarar, com visível amargura, que a provocação do procurador federal em Brasília, Hélio Heringer, pedindo a anulação do visto de Battisti e sua deportação a um terceiro país, era 'lamentavelmente' inviável.
  1. E, principalmente, para vigiar locais e emboscar resistentes, já que, percebendo a presença de viaturas policiais, eles teriam mais tempo para reagir e tentar escapar.
  2. A "conversão" se deu, na verdade, em meados da década de 1970, quando Golbery do Couto e Silva, o estrategista do (prestes a ser empossado) ditador Ernesto Geisel encontrou no aeroporto o sócio principal do Grupo Folha, Otávio Frias de Oliveira, aproveitando para antecipar-lhe que haveria uma distensão política e convinha ao jornal adotar uma postura mais ousada, não deixando que o concorrente O Estado de S. Paulo,  opositor ferrenho da ditadura a partir da promulgação do AI-5, surfasse sozinho na nova onda.
  3. Eu denunciei a parcialidade e as mentiras de Torregiani neste artigo, além de escrever à própria agência Ansa e aos veículos da nossa imprensa que estavam acolhendo tais falácias. Ninguém respondeu e outras matérias similares seriam publicadas adiante.
  4. Episódio no qual consegui uma rara admissão de culpa por parte do jornal da  ditabranda, conforme relato neste artigo.
  5. Um desses editoriais foi publicado no próprio dia do início do julgamento do pedido de extradição italiano por parte do STF e tinha clara intenção de intimidar os ministros. Mas, neste caso, o lobbismo só funcionou em parte, tangendo as primeiras decisões do Supremo mas não impedindo que, no final, o castelo de cartas desabasse.
  6. Trata-se de um plágio descarado do cemitério dos mortos-vivos do  cabôco Mamadô, para o qual o cartunista Henfil despachava os reaças nos saudosos tempos d'O Pasquim. Quanto ao Augusto Nunes, que presidia o centro acadêmico da ECA/USP quando nela ingressei (1972), é um Carlos Lacerda em miniatura: começou na esquerda e  endireitou  cada vez mais, vestindo a camisa dos seus empregadores, como o clã Mesquita do vetusto  Estadão. Mas, havendo oferta excessiva na praça de escribas dispostos a lamberem os sapatos dos burgueses, sua carreira foi declinando até chegar ao fundo do poço: blogueiro da veja
  7. É uma revista que não leva o nome do dono por acaso: Mino Carta erige suas paixões e idiossincrasias em linha editorial. Sendo admirador fervoroso do antigo Partido Comunista Italiano, é, coerentemente, inimigo furibundo dos agrupamentos mais à esquerda e dos veteranos da luta armada nos dois continentes. Mas, seus defeitos vão além da megalomania e espírito revanchista: insincero, nunca admitiu para seus leitores o real motivo de sua perseguição inquisitorial a Cesare Battisti, qual seja o de ser o escritor um remanescente das batalhas que a esquerda autêntica italiana travou contra o aburguesamento do PCI; intolerante, retirou-se do próprio blogue por não suportar as contestações dos internautas; e pusilâmine, várias vezes fingiu ignorar os desafios que o Rui Martins e eu lhe lançamos, para debater com um de nós o Caso Battisti (chegou a trombetear triunfalmente que o Zé Dirceu esquivara-se de um confronto com ele, mas emudeceu quando ofereci-me para substituir o Zé, disposto a duelar nas mesmíssimas condições).

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