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14.11.09

BATTISTI ANUNCIA GREVE DE FOME E ENTREGA SUA VIDA NAS MÃOS DE LULA

Detido em março de 2007 e mantido em prisão ilegal e arbitrária nos últimos dez meses, com o Supremo Tribunal Federal abusivamente ignorando que o Governo brasileiro já lhe concedeu o direito de viver em liberdade no nosso país, o escritor e perseguido político italiano Cesare Battisti não aguentou mais: entrou nesta sexta-feira (13) em greve de fome, na penitenciária da Papuda (DF).

Por meio do senador José Nery (PSOL/PA), Battisti encaminhou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva carta em que explica a sua decisão:
"Espero com isso impedir, num último ato de desespero, esta extradição, que para mim equivale a uma pena de morte. Sempre lutei pela vida, mas se é para morrer, eu estou pronto, mas, nunca pela mão dos meus carrascos. Aqui neste país, no Brasil, continuarei a minha luta até o fim, e, embora cansado, jamais vou desistir de lutar pela verdade. A verdade que alguns insistem em não querer ver, e este é o pior dos cegos, aquele que não quer ver".
A mensagem, que já se encontra em mãos do secretário geral da Presidência Luiz Dulci, faz menção ao passado militante de "muitos companheiros que hoje são responsáveis pelos destinos do povo brasileiro". Pois, sendo comprovadamente inocente dos crimes que lhe imputam, Battisti atribui a perseguição encarniçada que a Itália lhe move à tentativa de criminalização dos movimentos sociais que tiveram origem nas primaveras de 1968.

E faz um apelo dramático a Lula:
"Entrego minha vida nas mãos de Vossa Excelência e do Povo Brasileiro".
Chega-se, assim, à etapa que os movimentos de apoio a Battisti tanto temiam e tentaram evitar: a da colocação de sua vida em grave risco.

Pois, não só como partidário de sua causa, mas como jornalista com credibilidade a preservar, afirmo: Cesare irá até o fim.

CRISES DE DEPRESSÃO TÊM
SIDO FREQUENTES EM 2009


Mesmo após a terrível decepção sofrida na França, quando, sob pressões de todo tipo da Itália (incluindo uma campanha midiática quase idêntica à ora desenvolvida no Brasil), aquela nação desonrou o solene compromisso assumido pelo presidente Mitterrand com os asilados da ultraesquerda italiana, Battisti queria acreditar que desta vez seria diferente.

Ao mesmo tempo, ele era sempre o primeiro a advertir que a Itália repetia passo a passo a estratégia que deu certo na França. Este fantasma o assombra há tempo.

A gota d'água foi a inacreditável e inqualificável decisão do STF, de mantê-lo preso após já ter conquistado, para todos os efeitos, seu direito à liberdade, em janeiro último.

Desde então, vem sofrendo crises de depressão, mitigadas por medicamentos.

Supondo que a tendenciosidade no Supremo se limitasse ao presidente Gilmar Mendes e ao relator Cesar Peluso, Battisti cobrou insistentemente de seus apoiadores que exigissem a marcação do julgamento.

Mendes a vinha postergando indefinidamente e só cumpriu com seu dever quando questionado pelo maior jurista brasileiro da atualidade, Dalmo de Abreu Dallari, que o acusou de estar retaliando Battisti com uma prisão sem condenação.

Mas, evidenciou-se no julgamento que Mendes e Peluso não estavam sozinhos na faina de utilizar o Supremo como ponta de lança de uma escalada reacionária para minar a autoridade do Governo Lula e criminalizar os movimentos sociais.

O relatório de Peluso -- caso praticamente único em que, num episódio tão controverso, o relator acompanhou os acusadores em TODAS as questões, ignorando completamente os argumentos da defesa e tratando com arrogância ultrajante o arrazoado de um ministro de Estado -- abalou ainda mais a confiança de Cesare numa sentença justa.

Passou a afirmar que só se podia confiar nos movimentos sociais, pois a eles a Itália não conseguiria comprar nem intimidar.

AS PROVAS SURGEM...
E DE NADA ADIANTAM!


A entrada de um membro da Anistia Internacional dos Estados Unidos na luta -- Carlos Lungarzo, professor aposentado da Unicamp -- trouxe novas esperanças a Cesare: finalmente, havia fartura de provas documentais das torturas e das distorções jurídicas em que a Itália incorreu durante a repressão aos grupos de ultraesquerda nos anos de chumbo.

Até por respeito ao grande esforço que estava sendo desenvolvido por seus advogados e defensores voluntários para municiar os ministros do Supremo com as provas da verdade até então escamoteada, Battisti não se declarou em greve de fome antes do reinício do julgamento, na última quinta-feira (12).

Em seu voto, o ministro Marco Aurélio de Mello incorporou algumas das informações contidas nos relatórios da Anistia Internacional disponibilizados por Lungarzo.

Ademais, praticamente desconstruiu o relatório de Pelluso:
  • provando ser totalmente descabida (para não dizer falaciosa) a argumentação que este utilizara para justificar a usurpação da prerrogativa do Executivo de conceder refúgio;
  • revelando que a sentença italiana contra Battisti contém nada menos do que 34 menções ao fato de que os delitos praticados pelos Proletários Armados para o Comunismo eram políticos ("subversão contra o poder do Estado");
  • demonstrando irrefutavelmente que Battisti estaria sujeito a retaliações e correria sérios riscos na Itália; e
  • também irrefutavelmente, estabelecendo que os delitos a ele imputados já estão prescritos.
Exatamente por ser tecnicamente perfeito e haver refutado de forma tão cabal os principais pontos do relatório de Peluso, o voto de Marco Aurélio convenceu Battisti de que está sendo submetido a um julgamento político no STF: autênticos juristas, comprometidos unicamente com a verdade e a Justiça, teriam mudado seu voto.

Ele dava como casos perdidos Mendes e Peluso, mas tinha esperança de que a moeda caísse para os demais e eles recusassem o papel de linchadores. Nova decepção.

ENTRA COMBALIDO NI JEJUM:
JÁ HAVIA PERDIDO 5 QUILOS

E, ao ficar sabendo das declarações do porta-voz da Presidência, Marcelo Baumbach, segundo quem seu caso não estava excluído da pauta do encontro entre o presidente Lula e o premiê italiano Silvio Berlusconi na próxima 2ª feira (16), Battisti temeu que, como no episódio francês, as razões de estado (inclusive acordos comerciais) prevalecessem sobre o imperativo da Justiça.

Daí a decisão de se declarar em greve de fome.

O próprio nervosismo e ansiedade já vinham impedindo que se alimentasse direito. Vomitava o que ingeria e perdeu cinco quilos neste mês. Entra muito fragilizado no jejum, além de ser naturalmente magro.

Ou seja, não demorará muito para correr perigo de vida.

Que cada autoridade envolvida reflita se é esse mesmo o final que deseja para o caso; se quer passar à História como quem poderia evitar e não evitou a morte de Cesare Battisti.

A mim me parece simplesmente monstruoso que um homem morra em função de crimes ocorridos há mais de trinta anos, pelos quais foi condenado em processo sem testemunhas isentas, sem provas, sem perícias que se impunham e sem exercício real do direito de defesa.

E, ademais, que morra após ter demonstrado à sociedade que não oferece risco nenhum para ela, pois leva vida pacata e produtiva há nada menos do que três décadas.

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