Celso Lungaretti (*)
Militares adoram relembrar os poucos episódios excitantes que ocorrem em sua carreira de robotizada rotina. Então, como preso político em unidades do Exército nos anos de chumbo, eu passei mais de dois meses sofrendo torturas propriamente ditas e os nove meses seguintes submetido à tortura psicológica de ter de escutar seus relatos escabrosos.
Um deles foi tão chocante que nunca me saiu da lembrança. Os sentinelas de um quartel paulistano surpreenderam um estuprador em ação contra um menino. Sem autoridade para tanto – deveriam apenas entregá-lo à polícia civil –, levaram-no para a caserna e começaram a discutir qual seria sua punição.
Um velho sargento solucionou a questão. Fez com que lhe aplicassem vigorosas pancadas na sola do pé, com uma palmatória. Depois, obrigou-o a correr. Mais pancadas. Mais corridas. Mais pancadas. Ele já não conseguia nem andar, era arrastado à força pelos recrutas. Até que o sargento se deu por satisfeito e mandou atirá-lo numa solitária. Morreu gangrenado, em meio a sofrimentos atrozes.
Essa é a maneira como os militares gostam de resolver as coisas: direta, sem levar em conta as perfumarias jurídicas. É claro que, durante a ditadura, tudo ficava mais fácil. Agora, vez por outra, são pilhados abusando do seu poder. Mas, passada a onda inicial, tudo acaba sendo abafado.
Quando o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, manda ofício ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva pedindo a ajuda das Forças Armadas para “assegurar a lei e a ordem na região metropolitana do Rio”, o que ele pretende, afinal?
Se ele é incapaz de cumprir as atribuições do seu cargo, melhor seria renunciar de uma vez. E, se lhe faltam recursos para combater com eficiência o crime organizado, o que deve solicitar são verbas, não tropas.
Até prova em contrário, fica a impressão de que Cabral quer mesmo é a utilização de métodos menos ortodoxos contra os comandos de marginais. As Forças Armadas entram em ação com as simpatias da população exasperada, obtêm alguns resultados mediante o uso de força excessiva e, quando os inevitáveis episódios chocantes começarem a provocar indignação pública, já terão golpeado duramente os bandidos.
Isto não seria, claro, uma verdadeira solução. Os criminosos se rearticulariam e, adiante, o problema reapareceria. É a chamada mágica besta, boa apenas para dar aos cidadãos mais simplórios a impressão de que o governador tem muque.
Se a polícia estadual está corroída pela corrupção, a obrigação de Cabral é saneá-la, o quanto antes. Depois, dotá-la de efetivos suficientes para o bom cumprimento de suas tarefas, de treinamento e de equipamento adequados.
Como os integrantes dos comandos criminosos se ocultam entre a população dos morros, sua captura tem de ser confiada a unidades de elite, que consigam atingir seus objetivos com precisão cirúrgica – e não mandando bala a torto e a direito. O Estado não tem o direito de dispor a bel-prazer da vida dos favelados inocentes.
Este é, aliás, um grande problema da participação das Forças Armadas em operações policiais. A cultura militar é de responder sempre ao fogo inimigo. Se o inimigo está oculto no meio de civis, estes acabam levando as sobras.
Outro problema, obviamente, é que a Inteligência militar só funciona a contento com a aplicação indiscriminada de torturas. É inadmissível que, para enfrentarmos o desafio do crime organizado, tenhamos de abrir mão dos valores civilizados. Isto seria um mal maior ainda do que o mal que se pretende combater.
Por último, deixar que as Forças Armadas venham para as ruas é sempre um perigo. Da última vez, levamos 21 anos para fazê-las voltar aos quartéis.
Políticos do tipo de Lula e Cabral têm memória curta e só levam em conta seus interesses imediatos. Azar nosso. Quem não aprende com as lições da História, está condenado a repetir os erros... e colher os mesmos resultados.
* jornalista, escritor e ex-preso político. Outros artigos: http://celsolungaretti-orebate.blogspot.com/
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12.4.07
EM ABRIL, CABRAL DESCOBRE... OS QUARTÉIS!
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3 comentários:
Não concordo que a carreira militar seja rotineira; muito pelo contrário, considero-a uma das mais dinâmicas em termos de atividades que há; um dia vc fica de sentinela, no outro vc realiza uma faxina, no outro ministra alguma instrução ou assiste, em seguida faz uma corrida, semana que vem participa da instrução de tiro e demais atividades bélicas. Não sou militar mas já servi por um ano o Exército e nunca me arrependi, apesar de meu comportamento não ter sido dos melhores.
E se você acha que esse relato que você escutou é escabroso, eu sei de um em que pessoas após prenderem um estuprador na minha cidade do interior no momento em que violentava uma garotinha de 9 anos, muniram-se de um cano com a boca da largura de uma xícara de café e introduziram no reto do candidato, após isso, enfiaram um fio de arame farpado passando por dentro do cano; não satisfeitos, retiraram o cano e puxaram o arame farpado.
Agora chegando à questão em pauta, o certo mesmo seria como você disse, Cabral deveria solicitar verba para manutenção e reiteração da nossa polícia. No entanto se essa medida fosse adotada, só surtiria efeito a médio e longo prazo, e o que precisamos são de medidas imediatas; que no caso são as verbas humanas, ou seja, o Exército nas ruas. Só assim se poderá ter uma pré-coibição das ações dos bandidos contra motoristas na linha amarela e vermelha dentre outras localidades. O fato de o Exército estar nas ruas não irá impedir que grupos de elite possam continuar atuando com precisão cirúrgica nas áreas determinadas, pode-se muito bem trabalhar em conjunto principalmente na troca de informações, isso sem falar que as forças especiais do Exército são bem mais capacitadas para se trabalhar com intervenção cirurgicamente precisa do que as forças do Bope ou da Core; isto é, forças especiais é o que não falta, o que falta é a intimidação da ousadia desses bandidos que saem empunhando fuzil e pistola e fazem a ronda no quarteirão como se estivesses em um quartel do Exército ou em uma terra sem lei, a qual se pode andar livremente com FALs, HKs e granadas pelas ruas, isso sem contar os inúmeros arrastões nas áreas de trânsito intenso.
Já quanto ao perigo das Forças Armadas na rua e um eventual golpe, eu prefiro pagar para ver.
Caro Celso,
Eu acho que se o cidadão já contribui com impostos, que depois se transforma em salários dos policiais, juízes e etc, estes servidores pagos pelo contribuinte é que devem arcar com a segurança pública. A tarefa do exército não é ocupar favela e combater bandidos/traficantes. Que a sociedade civil saia as ruas pacificamente e peça urgente melhorias para as nossas polícias estaduais. Para quem esqueceu: as forças armadas já participaram de repressão aos bandidos nos morros cariocas e assim que saíram, voltaram os bandidos, com maior poder de fogo e deixaram um saldo de alguns soldados do exército acusados de se envolverem com os traficantes, mas como nem os comandantes militares querem ficar eternamente ocupando as favelas, assim que eles saírem, voltarão os bandidos que continuarem vivos e a situação será a mesma de antes.
A primeira boa solução do Governador Cabral se ele quer mesmo enfrentar o problema sem demagogia seria: "limpar" as polícias dos maus policiais, expulsar principlamente aqueles que se envolvem com bandidos para aumentarem a renda, tentar ao menos deminuir a corrupção, que é uma questão antiga no Rio de Janeiro e admitida pelos próprios policiais.
ISMAR
ismarsouza@hotmail.com
Queria ver se fosse vc ou a sua companheira os violentados e se vocês iriam esperar que essa nossa Justiça (mais arcaica que o comportamento dos militares que vc tanto marreta) fizesse sua parte. Iam definhar esperando. Hipócrita!
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